LIVRO: Ideias para adiar o fim do mundo, de Ailton Krenak

Confira algumas passagens do bela fala de uma das principais lideranças indígenas brasileiras (e mundiais)

Falemos de um livro delicioso sobre o apocalipse em que vivemos, sobre a separação da humanidade da natureza. Era pra gente se ver, se saber, como natureza, considerar um rio como avô, tal como é considerado o Rio Doce pelo povo indígena Krenak. Eu percorri este rio, numa linda viagem de trem com minha mãe, de Belo Horizonte até Vitória, e quando vi a notícia de que o rio estava morto pelo crime ambiental da lama tóxica da Samarco e da Vale, chorei. Como pode?

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Ailton Krenak, uma das principais lideranças indígenas do Brasil, e do mundo, explica sobre essa perplexidade com uma fala fácil de ser compreendida, e muito sábia. A saber, a descrição do livro é compreendida como a seguinte:

Uma parábola sobre os tempos atuais, por um de nossos maiores pensadores indígenas. Ailton Krenak nasceu na região do vale do rio Doce, um lugar cuja ecologia se encontra profundamente afetada pela atividade de extração mineira. Neste livro, o líder indígena critica a ideia de humanidade como algo separado da natureza, uma “humanidade que não reconhece que aquele rio que está em coma é também o nosso avô”. Essa premissa estaria na origem do desastre socioambiental de nossa era, o chamado Antropoceno. Daí que a resistência indígena se dê pela não aceitação da ideia de que somos todos iguais. Somente o reconhecimento da diversidade e a recusa da ideia do humano como superior aos demais seres podem ressignificar nossas existências e refrear nossa marcha insensata em direção ao abismo.

“Nosso tempo é especialista em produzir ausências: do sentido de viver em sociedade, do próprio sentido da experiência da vida. Isso gera uma intolerância muito grande com relação a quem ainda é capaz de experimentar o prazer de estar vivo, de dançar e de cantar. E está cheio de pequenas constelações de gente espalhada pelo mundo que dança, canta e faz chover. […] Minha provocação sobre adiar o fim do mundo é exatamente sempre poder contar mais uma história.”

Desde seu inesquecível discurso na Assembleia Constituinte, em 1987, quando pintou o rosto com a tinta preta do jenipapo para protestar contra o retrocesso na luta pelos direitos indígenas, Krenak se destaca como um dos mais originais e importantes pensadores brasileiros. Ouvi-lo é mais urgente do que nunca. Ideias para adiar o fim do mundo é uma adaptação de duas conferências e uma entrevista realizadas em Portugal, entre 2017 e 2019.

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A seguir, apresento um fichamento de alguns trechos do livro, intercalado com algumas perguntas propostas, a fim de facilitar as respostas das buscas online.

KRENAK, Ailton. Ideias para adiar o fim do mundo. São Paulo: Companhia das Letras, 2019, 85 p.

p. 12

Pensemos nas nossas instituições mais bem consolidadas, como universidades ou organismos multilaterais, que surgiram no século XX: Banco Mundial, Organização dos Estados Americanos (OEA), Organização das Nações Unidas (ONU), Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco). Quando a gente quis criar uma reserva da biosfera numa região do Brasil, foi preciso justificar para a Unesco por que era importante que o planeta não fosse devorado pela mineração. Para essa instituição, é como se bastasse manter apenas alguns lugares como amostra grátis.

p. 14

Se as pessoas não tiverem vínculos profundos com sua memória ancestral, com as referências que dão sustentação a uma identidade, vão ficar loucas neste mundo maluco que compartilhamos.

Para que serve o mito da sustentabilidade?

p. 16

(…) o mito da sustentabilidade, inventado pelas corporações para justificar o assalto que fazem à nossa ideia de natureza.

Como será o futuro?

p. 20

Nós, a humanidade, vamos viver em ambientes artificiais produzidos pelas mesmas corporações que devoram florestas, montanhas e rios.

O que é desenvolvimento sustentável?

p. 22

(…) E tem uma camada mais bruta, rústica, orgânica, uma sub-humanidade, uma gente que fica agarrada à terra. Parece que eles querem comer terra, mamar na terra, dormir deitados sobre a terra, envoltos na terra. A organicidade dessa gente é uma coisa que incomoda, tanto que as corporações têm criado cada vez mais mecanismos para separar esses filhotes da terra de sua mãe. (…) Recurso natural para quem? Desenvolvimento sustentável para quê? O que é preciso sustentar?

p. 24

Para citar o Boaventura de Sousa Santos, a ecologia dos saberes deveria também integrar nossa experiência cotidiana, inspirar nossas escolhas sobre o lugar em que queremos viver, nossa experiência como comunidade. Precisamos ser críticos a essa ideia plasmada de humanidade homogênea na qual há muito tempo o consumo tomou o lugar daquilo que antes era cidadania.

Qual é o sentido da vida?

p. 26

Nosso tempo é especialista em criar ausências: do sentido de viver em sociedade, do próprio sentido da experiência da vida. Isso gera uma intolerância muito grande com relação a quem ainda é capaz de experimentar o prazer de estar vivo, de dançar, de cantar. E está cheio de pequenas constelações de gente espalhada pelo mundo que dança, canta, faz chover.

p. 27

E a minha provocação sobre adiar o fim do mundo é exatamente sempre poder contar mais uma história.

Como os índios resistem?

p. 31

A gente [índios] resistiu expandindo a nossa subjetividade, não aceitando essa ideia de que nós somos todos iguais.

p. 32

Se existe uma ânsia por consumir a natureza, existe também uma por consumir subjetividades – as nossas subjetividades.

p. 32 e 33

Já que a natureza está sendo assaltada de uma maneira tão indefensável, vamos, pelo menos, ser capazes de manter nossas subjetividades, nossas visões, nossas poéticas sobre a existência.

p. 39

(…) a máquina estatal atua para desfazer as formas de organização das nossas sociedades, buscando uma integração entre essas populações e o conjunto da sociedade brasileira.

Como era o Rio Doce? Quem era o Rio Doce?

p. 40

O rio Doce, que nós, os Krenak, chamamos de Waty, nosso avô, é uma pessoa, não um recurso, como dizem os economistas.

Como se salvar no fim do mundo?

p. 44

Sentimo-nos como se estivéssemos soltos num cosmos vazio de sentido e desresponsabilizados de uma ética que possa ser compartilhada, mas sentimos o peso dessa escolha sobre as nossas vidas. Somos alertados o tempo todo para as consequências dessas escolhas recentes que fizemos. E se pudermos dar atenção a alguma visão que escape a essa cegueira que estamos vivendo no mundo todo, talvez ela possa abrir a nossa mente para alguma cooperação entre os povos, não para salvar os outros, mas para salvar a nós mesmos.

(…) as realidades que nós vivíamos no Brasil teve como objetivo ativar as redes de solidariedade com os povos nativos.

Como é a era das experiências?

p. 45

A experiência das pessoas em diferentes lugares do mundo se projeta como mercadoria, significando que ela é tudo o que está fora de nós.

O que é recurso natural?

p. 51

Como reconhecer um lugar de contato entre esses mundos, que têm tanta origem comum, mas que se descolaram a ponto de termos hoje, num extremo, gente que precisa viver de um rio e, no outro, gente que consome rios como recurso? A respeito dessa ideia de recurso que se atribui a uma montanha, a um rio, a uma floresta, em que lugar podemos descobrir um contato entre as nossas visões que nos tire desse estado de não reconhecimento uns dos outros?

p. 57

Talvez estejamos muito condicionados a uma ideia de ser humano e a um tipo de existência.

Como é o fim do mundo? Quando é o fim do mundo?

p. 60

O fim do mundo talvez seja uma breve interrupção de um estado de prazer extasiante que a gente não quer perder. Parece que todos os artifícios que foram buscados pelos nossos ancestrais e por nós têm a ver com essa sensação. Quando se transfere isso para a mercadoria, para os objetos, para as coisas exteriores, se materializa no que a técnica desenvolveu, no aparato todo que se foi sobrepondo ao corpo da mãe Terra.

p. 63

Já que aquilo que realmente gostamos é gozar, viver no prazer aqui na Terra. Então, que a gente pare de despistar essa nossa vocação e, em vez de ficar inventando outras parábolas, que a gente se renda a essa principal e não se deixe iludir com o aparato da técnica. Na verdade, a ciência inteira vive subjugada por essa coisa que é a técnica.

p. 64

Acabaram os cientistas. Toda pessoa que seja capaz de trazer uma inovação nos processos que conhecemos é capturada pela máquina de fazer coisas, de mercadoria.

O que é Antropoceno?

p. 72

Assim como nós estamos hoje vivendo o desastre do nosso tempo, ao qual algumas seletas pessoas chamam Antropoceno. A grande maioria está chamando de caos social, desgoverno geral, perda de qualidade no cotidiano, nas relações, e estamos todos jogados nesse abismo.


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